Com o Terrorismo de Counter Strike pela Liberdade Por Arthur Meucci Tenho um irmão que há dois anos atrás comprou um jogo chamado Half-Life Counter Strike. Fascinado por jogos eletrônicos ele adorava este jogo de tiro em primeira pessoa onde você pode ser um terrorista protegendo seus reféns ou um anti-terrorista que deve resgatá-los. Claro que o único meio empregado é o uso da violência. Como todo intelectual mané vi neste jogo uma propaganda estadosunidenses para engajar os jovens nas atuais geopolíticas militares, como fazem os outros produtos culturais que são trazidos de lá. Como irmão e cidadão eu somente o adverti para as questões subjacentes e ocultas que este tipo de jogo trazia. Cumpri meu papel. Em nenhum momento tentei coagi-lo para desinstalar o programa e devolver o produto na loja. Afinal, ele é maior de idade, goza do pleno uso da razão, e comprou o produto com dinheiro próprio. Como filósofo consciente não posso admitir que minha vontade, e minhas crenças, se sobreponham a liberdade de outrem, desde que a ação não me prejudique. Pois bem, ao andar pela Avenida Paulista após o Carnaval me deparo com uma manifestação em frente ao MASP. Naquele lugar havia uma concentração de pessoas um tanto estranhas, com cartazes que a primeira vista eram enigmáticos, pedindo a liberdade de comprar um jogo. Ao chegar perto percebo que se trata do bom e velho Counter Strike. Segundo os manifestantes um juiz da Vara Federal de Seção Judiciária, em Minas Gerais, acatou o pedido do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor de proibir a venda deste jogo e de um outro chamado Everquest (que não faço idéia do que seja). Abismado com o que ouvi dos manifestantes comecei a me questionar: o que poderia legitimar o judiciário ou o Estado em restringir minha liberdade de comprar um jogo? Ou melhor, em que circunstâncias o Estado pode interferir na minha liberdade individual? As palavras do bom e velho filósofo Stuart Mill ressoavam por todo o meu cérebro. Sabemos que vivendo em sociedade nossa liberdade pode ser limitada pelas “funções de polícia”, ou seja, que podemos perdê-la em parte ou totalmente no intuito de prevenir crimes ou acidentes. Segundo o senso comum é preciso estabelecer certas regras e limitações para se viver em sociedade. Se, por exemplo, todos pudessem ter um carro e correr com ele pela rua, sem nenhum limite, a vida de motoristas e pedestres estaria ameaçada. Mas então, por que não se proíbe a venda de carros? Ora, eles são úteis quando usados corretamente e podem salvar vidas em casos de emergência. Assim, se justificaria as leis de transito e a função de polícia para proteger a segurança de motoristas e pedestres. Pois bem, em que medida nos proibir de comprar estes jogos se enquadram na função de polícia? Vamos analisar os argumentos. O juiz avaliou que os jogos “trazem imanentes estímulos à subversão da ordem social, atentando contra o Estado democrático e de direito e contra a segurança pública”
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. A acusação frisou que o jogo potencialmente (em outras palavras, “hipoteticamente”) pode causar distúrbios comportamentais de característica agressiva quando menores de idade se expõe por muito tempo ao jogo. O que significaria “trazer imanentes estímulos”? Por imanente, neste caso, significa “em essência”, ou seja, que está contido no jogo. Mas o que ele conteria? Um estímulo. Em outras palavras, induzir um provável comportamento no jogador. Comportamento que, segundo o juiz, poderia produzir uma subversão da ordem social. Subentendesse o desacato às leis e aos órgãos de segurança. Perceba que em nenhum momento ele afirma que o jogo produz esta tendência nociva, mas que provavelmente ele pode induzir ao crime. O álcool sabidamente leva as pessoas que o consome em excesso a subverter a ordem. Ele certamente produz um estímulo maior que o jogo. Por que então não proibir a venda de álcool? Nunca soube de alguém que tenha matado após jogar este jogo, porém de bêbados sim. Qual a significativa diferença que os separa e que torna o jogo mais perigoso? O argumento da acusação de que jogo poderia, em hipótese, causar distúrbios comportamentais em menores com alta exposição ao mesmo também não parece convencer. Artes marciais, pintball, e filmes como Tropa de Elite causam mais estímulos agressivos do que o jogo em questão. Por que então não proibi-los? Alguns dirão que os pais têm o direito e a liberdade de escolher se seus filhos podem ou não ir ao pintball ou assistir um filme violento. Afinal, sãos os pais que conhecem e educam suas crianças. Então, por que não exigir somente que o jogo tenha uma advertência sobre seus efeitos colaterais e restringir a venda para menores de idade? Não é mais fácil cobrar o pai e pedir que ele assine um termo de consentimento para que o filho possa jogar os jogos em casa ou na lan house? As contra-respostas para estas questões são muito mais reveladoras. Eles dizem que há dois problemas que atenuam o caso. O primeiro é a comercialização ilegal de jogos. O comércio de programas piratas e lan houses sem fiscalização poderiam oferecer o jogo para menores sem exigir autorização. Perceba então que o Estado afirma que é INCAPAZ de exercer a função de polícia contra o crime de pirataria e de fiscalizar estabelecimentos irregulares. Além disso, se mostra incapaz de oferecer uma educação pública e de qualidade em que se possa ter um espaço para ensinar os jovens os problemas trazidos pelos jogos e pelo comércio ilegal de programas. Como é ineficiente no combate ao crime, o Estado simplesmente abusa de seu poder e restringe nossas liberdades. É muito mais fácil nos limitar do que resolver os problemas. Fórmula simples de todo Estado totalitário e/ou reacionário. O segundo argumento é a perda de autoridade por parte dos pais. Segundo esta perspectiva muitos pais não conseguem educar e impor limite aos filhos, logo isso abre brecha para que estes menores desobedeçam e achem um jeito de jogar. Assim, filhos responsáveis e adultos têm seus direitos negados pela INCOMPETÊNCIA de pais que não educam corretamente sua prole. Mais uma vez pais irresponsáveis jogam para o Estado a responsabilidade de proteger e controlar seus filhos, se eximindo de suas obrigações. Notamos nestas duas questões que as autoridades, ao invés de exercerem corretamente a ação de polícia para combater o crime e nos proteger, abusam de suas forças e ferem nossa liberdade. E ai a velha questão se coloca: É legítimo deixar uma pessoa fazer algo potencialmente perigoso, como jogar este jogo? Depende. Se a pessoa estiver desavisada sim, pois a liberdade consiste em se fazer o que deseja, e ninguém deseja ter distúrbios mentais com o jogo. Porém, se a pessoa foi avisada dos riscos que o jogo pode trazer, e esta de plena posse da razão (não sendo um louco, um drogado, ou uma criança), cabe a ela decidir o que fazer. Respeitar sua liberdade de escolha. Sua liberdade individual. Filosofando de Arthur Meucci. TODOS PELA LIBERAÇÃO DO COUNTER-STRIKE!(os caras do Combat Arms vão torce para que isso não ocorra!)